A Revolta dos Búzios, Revolta dos Alfaiates ou Conjuração Baiana foi a luta daqueles que “sonhavam com uma república democrática, com o fim da escravidão e das desigualdades entre brancos e negros, em pleno século 18, na cidade de Salvador”,

A CONJURAÇÃO BAIANA DE 1798 - REVOLTA DOS BÚZIOS - LIBERDADE, FRATERNIDADE, IGUALDADE

A segunda metade do século XVIII é marcada por profundas transformações na história, que assinalam a crise do Antigo Regime europeu e de seu desdobramento na América, o Antigo Sistema Colonial. No Brasil, os princípios iluministas e a independência dos Estados Unidos, já tinham influenciado a Inconfidência Mineira em 1789. Os ideais de liberdade e igualdade se contrastavam com a precária condição de vida do povo, sendo que, a elevada carga tributária e a escassez de alimentos, tornavam ainda mais grave o quadro sócio-econômico do Brasil. Este contexto será responsável por uma série de motins e ações extremadas dos setores mais pobres da população baiana, que em 1797 promoveu vários saques em estabelecimentos comerciais por-tugueses de Salvador. Nessa conjuntura de crise, foi fundada em Salvador a “Academia dos Renascidos”, uma associação literária que discutia os ideais do iluminismo e os problemas sociais que afetavam a população. Essa associação tinha sido criada pela loja maçônica “Cavaleiros da Luz”, da qual participavam nomes ilustres da região, como o doutor Cipriano Barata e o professor Francisco Muniz Barreto, entre outros. A conspiração para o movimento, surgiu com as discussões promovidas por esta Academia e contou com a participação de pequenos comerciantes, soldados, artesãos, alfaiates, negros libertos e mulatos, caracterizando-se assim, como um dos primeiros movimentos populares da História do Brasil. As inflamadas discussões na “Academia dos Renascidos” resultarão na Conjuração Baiana em 1798. A participação popular e o objetivo de emancipar a colônia e abolir a escravidão, marcam uma diferença qualitativa desse movimento em relação à Inconfidência Mineira, que marcada por uma composição social mais elitista, não se posicionou formalmente em relação ao escravismo. O movimento revolucionário baiano de 1798, mais conhecido como a Revolta dos Alfaiates ou Revolta dos Búzios, é um dos mais amplos, do ponto de vista político, econômico e social ocorridos no Brasil-Colônia. Segundo os historiadores Tavares (1999) e István (1975), até o final do século XVIII, nenhum movimento político no Brasil possuíra um programa tão amplo, com penetração tão profunda nas classes e camadas sociais, quanto este.

A convoação pelos Revolucionários

Com fundamental participação de escravos e seus descendentes, pretos e pardos, soldados, pequenos comerciantes, artesãos – com um grande número de alfaiates - o movimento discutia os caminhos para o Brasil livre da tutela portuguesa, tornando-se uma república democrática, na qual a cor da pele não fosse razão para discriminação. Entre as lideranças do movimento, destacaram-se os alfaiates João de Deus do Nascimento e Manuel Faustino dos Santos Lira (este com apenas 18 anos de idade), além dos soldados Lucas Dantas e Luiz Gonzaga das Virgens, todos mulatos. Um outro destaque desse movimento foi a participação de mulheres negras, como as forras Ana Romana e Domingas Maria do Nascimento, Luiza Francisca de Araújo, Lucrecia Maria Gercent e Vicência.
Assim, em agosto de 1798 começam a aparecer nas portas de igrejas e casas da Bahia, panfletos que pregavam um levante geral e a instalação de um governo democrático, livre e independente do poder metropolitano. Em 12 de agosto de 1798, os conspiradores colocaram nos muros da cidade papéis manuscritos chamando a população à luta e proclamando idéias de liberdade, igualdade, fraternidade e República: “está para chegar o tempo feliz da nossa liberdade: o tempo em que seremos irmãos: o tempo em que todos seremos iguais”; ...”Homens o tempo é xegado para vossa ressurreição, sim para que ressuscitareis do abismo da escravidão, para que levantareis a sagrada Bandeira da Liberdade”.

A Repressão: prissões, degredo e enforcamentos

Uma terrível repressão tomou conta da Cidade do Salvador. A repressão ao movimento foi das mais violentas, com a execução de quatro revolucionários baianos, enforcados na Praça da Piedade. A violenta repressão metropolitana conseguiu deter o movimento, que apenas iniciava-se, detendo e torturando os primeiros suspeitos. Governava a Bahia nessa época (1788-1801) D. Fernando José de Portugal e Castro, que encarregou o coronel Alexandre Teotônio de Souza de surpreender os revoltosos. Com as delações, os principais líderes foram presos e o movimento, que não chegou a se concretizar, foi totalmente desarticulado. Após o processo de julgamento, os mais pobres como Manuel Faustino dos Santos Lira e João de Deus do Nascimento e os mulatos Luiz Gonzaga das Virgens e Lucas Dantas foram condenados à morte por enforcamento, sendo executados na Praça da Piedade a 8 de novembro de 1799. Outros, como Cipriano Barata, o tenente Hernógenes d’Aguilar e o professor Francisco Moniz foram absolvidos. Os pobres Inácio da Silva Pimentel, Romão Pinheiro, José Félix, Inácio Pires, Manuel José e Luiz de França Pires, foram acusados de envolvimento “grave”, recebendo pena de prisão perpétua ou degredo na África. Já os elementos pertencentes à loja maçônica “Cavaleiros da Luz” foram absolvidos deixando clara que a pena pela condenação, correspondia à condição sócio-econômica e à origem racial dos condenados. A extrema dureza na condenação aos mais pobres, que eram negros e mulatos, é atribuída ao temor de que se repetissem no Brasil as rebeliões de negros e mulatos que, na mesma época, atingiam as Antilhas. Todos os enforcados eram pardos, jovens, sendo dois soldados e dois alfaiates. Os heróis e mártires da Revolução foram: Manuel Faustino dos Santos Lira, pardo, forro, alfaiate, 18 anos; Lucas Dantas de Amorim Torres, pardo, liberto, soldado e marceneiro, 24 anos; João de Deus do Nascimento, pardo, livre, alfaiate, 27 anos; Luiz Gonzaga, pardo, livre, soldado, 36 anos. O pardo, escravo, lavrante, 32 anos, Luis Pires, escapou de ser preso. Seria enforcado.Também Pedro Leão de Aguillar Pantoja, branco, pequeno comerciante, que seria preso e degregado para a África. Muitos foram degredados para a África e Fernando de Noronha. Outros revolucionários tiveram penas de prisão e entre eles estão cinco mulheres: Luiza Francisca de Araújo, parda, 30 anos, mulher de João de Deus; Lucréia Maria Gercent, crioula, forra; Domingas Maria do Nascimento, parda, forra; Ana Romana Lopes, parda, forra; Vicência, crioula, forra. Houve 45 pessoas presas entre homens e mulheres, só nos três primeiros meses de repressão policial.

Salvador parou para ver o sacrifício dos mártires.



Lucas Dantas e Manuel Faustino vieram a pé da cadeia ao patíbulo. Em volta deles, além dos guardas, muitos religiosos. Quando os quatro chegam à forca, a soldadesca dá as costas para o interior da praça. Mantém as armas apontadas para o povo. Uma tropa disposta a atirar diante de qualquer manifestação. Uma tropa tensa, cheia de medo. A Colônia queria dar o exemplo. A tropa, no entanto, temia a reação dos negros e mulatos que acompanhavam o espetáculo de dor e sangue e martírio.

Tudo durou seis horas: das 9 da manhã, exata hora em que os quatro mártires saíram da cadeia, às 3 da tarde, quando os quatro jaziam sem vida, quando então tudo terminou.

Terminou, vírgula. O espetáculo macabro, pleno de crueldade e cálculo, havia de continuar.

Mortos os quatro, tiveram seus corpos esquartejados. Pedaços dos corpos dos mártires foram expostos em lugares públicos para que todo mundo visse, para que todos soubessem que aquele seria o destino de quantos se rebelassem contra a Coroa portuguesa.

A cabeça de Lucas Dantas, espetada no Campo do Dique, na parte do Desterro. A de Manuel Faustino, no Cruzeiro de São Francisco. A de João de Deus, na Rua Direita do Palácio. A de Luís Gonzaga, juntamente com as mãos, na própria Praça da Piedade, afixadas nos caibros do patíbulo. Todos, locais centrais de Salvador.

Durante cinco dias, a população de Salvador olhou nos olhos mortos dos quatro mártires, olhou para suas cabeças despregadas dos corpos, certamente alternando sentimentos de compaixão e indignação. No dia 13 de novembro de 1799, repitamos as datas, as cabeças cortadas foram retiradas das ruas e enterradas.

sábado, 11 de setembro de 2010

Búzios ou Alfaiates?

Há controvérsias quanto ao uso do termo Revolta dos Búzios. Então, seria melhor chamá-la de Revolta dos Alfaiates ou Inconfidência Baiana?
Comentem!